Um hotel de gelo

O telefone na recepção nunca toca.

Os móveis e pilares chegam a brilhar e ganham cores com luzes especiais.


O hotel de gelo, ou "Hôtel de Glace" em francês, língua nativa na província de Québec, fica a dez minutos do centro da cidade de Quebéc, no Canadá. Funciona há catorze anos, sempre no outono-inverno. Daqui um mês, ele vai ser destruído. Como é feito só de neve e gelo, não sobra nada. Em novembro, será remontado para uma nova temporada. (A atual começou em 5 de janeiro e vai até 23 de março.)

A decoração é temática e muda todo ano. O tema deste ano é mitos e lendas do mundo antigo. Ao todo são 44 quartos. 
Animais alados, deuses e símbolos de várias culturas. As esculturas e relevos são como obras de arte. Cada quarto tem uma decoração exclusiva. Tem até reprodução dos famosos moais da ilha de páscoa. A cama também é de gelo. Eu testei – é confortável...








Passar a noite aqui custa a partir de 448 dólares, cerca de R$ 1,1 mil (na cotação de 18/2/14). Com lareira no quarto sai um pouco mais caro. A turista peruana Rose Galbes foi só passear. E ficou encantada. “Me parece fantástico!”, diz. Ela cita que no Peru não tem frio e gelo assim. Mas quando eu pergunto se ela passaria uma noite lá... “No, no! Hace mucho frio!”.

O hotel de gelo é uma das atrações turísticas da cidade de Quebéc. Também sedia festas, inclusive de casamento. Tem até uma capela. De gelo, claro.

Os universitários brasileiros gostaram. “É muito legal, diferente de tudo o que a gente já viu”, afirmou Gabriele dos Santos Lucchese, estudante de Psicologia. “Os quartos são lindos...”, diz o colega Cecil Ramos, estudante de Medicina. “Dá para passar uma noite aqui?”, pergunto. “Por uma noite eu encararia”, ele fala.

O passeio termina no bar. Os turistas se divertem com a música. Tem até quem arrisque uns passos. Mas o lugar preferido é o balcão do barman. Eu, claro, não pude deixar de conferir como é tomar um drinque num copo de gelo... "Saúde!"
 



 




Esta visita foi, sem dúvida, daquelas experiências inesquecíveis. E difíceis de descrever. Algo único, efetivamente inusitado e original. Ah, e divertida!
Em tempo: a temperatura externa girava entre 15 e 20 graus negativos. Dentro do hotel, a sensação térmica é exatamente a mesma - ou seja, é frio. Só não tem vento, o que ameniza um pouco a situação.
Texto adaptado a partir do original feito para reportagem do “Jornal da Cultura”, da TV Cultura. A matéria, exibida em 19 e 20/2/14 (edição da noite e Primeira Edição), pode ser vista abaixo:

Panamá: índios, latinos, piratas e um ditador

A riqueza do Panamá não está apenas no canal, nos centros de compras da capital ou no setor financeiro. O país tem uma rica cultura, que mistura influências da colonização espanhola, dos escravos e índios.
A música é apenas mais um elemento no divertido e colorido corredor às margens do pacífico, em Casco Antiguo. É lá que se concentra a feirinha. O artesanato é diversificado e reflete a mistura de etnias que formaram o Panamá. A maioria da população é mestiça de índios e escravos com europeus. Entre os indígenas, há guaranis, cunas e chocós. Na feirinha, além dos tradicionais souvenirs, é possível encontrar tapeçarias, estampas e materiais de lã. Cada um seguindo uma tradição.


Ali também está um outro produto que leva o nome do país mundo afora. Ou melhor, que não deixa o Panamá sair da cabeça. E como tradição é tradição, é bom explicar logo: o chapéu Panamá não é daqui. “O nome se deve ao presidente Theodor Roosevelt quando veio inspecionar as obras do canal. Ele usou um chapéu destes porque estava na moda e fazia muito calor. Ele foi o primeiro presidente dos EUA a sair (do país). Quando voltou aos Estados Unidos com fotos da volta ao mundo com o chapéu, as pessoas perguntavam: ‘Este chapéu é muito elegante, como se chama?’. Ele pensou: ‘é do Panamá’. ‘Panamá!’. Por isto o nome é chapéu do Panamá, mas é feito no Equador”, contou o vendedor Lenin Santana.
O chapéu custa de US$ 15 a US$ 300, mas segundo o vendedor, um certo senhor Afonso Capone, ou simplesmente Al Capone, chegou a pagar US$ 30 mil por um exemplar.
Mas se o chapéu Panamá, que na verdade é feito no Equador, é mais tradicional, a cultura panamenha não deixou de lado suas próprias tradições. “O chapéu do Panamá é este e se chama sombrero pintado. Há vários tipos de chapéu, este um, este outro também é feito aqui. (...) Vende muito. As pessoas buscam muito o chapéu Panamá e este, ambos. São muito populares, muito conhecidos”, citou Santana.

  
Uma nação que se orgulha da sua cultura e da sua história. Novembro, quando estivemos lá, é o mês da pátria. Uma comemoração pela independência, ocorrida em 1903. Durante todo o mês, o país se veste de vermelho, azul e branco. Nos postes, o enfeite fica a cargo do governo.
Mas o que chama a atenção é a exposição de bandeiras com as cores nacionais nas empresas, casas e até nos carros. Estão por todo lado, de todos os tamanhos. No alto do cerro Ancón, o principal monte da capital, ela aparece soberana.







  
  
  




   
O tricolor das bandeiras se mistura ao colorido dos prédios do bairro de Chorrillo. Um lugar cuja história remonta ao século 17. Aqui, fora dos muros que existiam quando Casco Antiguo era o centro do vilarejo, moravam os escravos. Séculos depois, os muros não existem mais, mas os moradores de Chorrillo seguem à margem da riqueza da capital. E o local continua fazendo história. Aqui funcionava o quartel general do ditador Manuel Noriega, que governou o país entre 1983 e 89.
Colaborador da Cia, a Central de Inteligência dos Estados Unidos, Noriega se tornou inimigo dos norte-americanos, acusado de ajudar os cartéis de drogas da Colômbia. Em dezembro de 1989, o presidente americano George Bush ordenou a invasão do Panamá. O objetivo era derrubar e prender Noriega. Os ataques duraram duas semanas. Cerca de três mil pessoas morreram, a maioria civis.
Muitas batalhas ocorreram em Chorrillo. “Segundo contam os moradores, os americanos trouxeram armas para distribuir para a população para que ela pudesse combater as forças do então ditador. E muitas dessas armas continuam no meio da população até hoje. Tanto é que o lugar virou uma área perigosa. Os moradores chamam de zona vermelha, comandada pelas bandas. Bandas são como gangues, organizações criminosas. Tentamos entrevistar moradores lá e ninguém quis gravar entrevista.
As ruas são vigiadas por guardas. Existem pelo menos cinco facções na região: Calor Calor, Pentágono, Bagdá, Evolution e MON. Elas teriam ligações com grupos colombianos e mexicanos.
No muro, o grafite lembra o período da invasão norte-americana e as armas nas mãos de crianças.




Noriega se entregou em 3 de janeiro de 1990. Foi condenado nos Estados Unidos a 30 anos de prisão por tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Também foi condenado pelo assassinato de dois políticos panamenhos e pelo fuzilamento de soldados em 1989.
Após cumprir pena por 21 anos nos Estados Unidos e França, o ex-ditador voltou ao Panamá em dezembro de 2011. Hoje, aos 79 anos e com problemas de saúde, ele vive entre o hospital e a prisão.
Desde a queda do ditador, o Panamá não tem mais exército.
Noriega é um capítulo da história de um país descoberto em 1501, mas que virou nação de fato há pouco mais de cem anos. Um lugar que carrega as marcas de sua história em Panamá Viejo e Casco Antiguo. E que apresenta modernidade e riqueza banhadas pelo Pacífico.
Um país com histórias de piratas e desbravadores. E de gente simples, que deixa a vida passar ao som do banjo.


* Reportagem feita originalmente para o programa "Matéria de Capa", da TV Cultura (dom., 19h)

Panamá, um país em crescimento

País em desenvolvimento, o Panamá diversificou sua economia. O canal é fonte importante de recursos, mas o setor financeiro e o turismo também se destacam.
Corredores movimentados, consumidores carregando sacolas, gente indo e vindo com compras ou simplesmente passeando. O carrossel que diverte as crianças no Albroock Mall mostra como os grandes shoppings da Cidade do Panamá ajudam a girar a economia do país. Grande parte do público é local, mas há também turistas, principalmente da Colômbia e Venezuela. Aqui, brasileiros fazem a festa com os preços baixos. Até parece Miami, a nova meca do consumo "brazuca".
A empresária Tatiana Ferreira foi ao Panamá de olho nas compras. E diz que valeu a pena: “Muito. Muita a pena, estou amando”. E já gastou bastante? “Bastante. Lua de mel pode, aproveito!”

  


  

No Multiplaza, estão as marcas de luxo com preços atraentes. São pelo menos três grandes shoppings, com mais de mil lojas, além de uma área de comércio mais popular, Los Pueblos.





Os centros de compras com preços semelhantes aos de Miami são um chamariz para estrangeiros. O Panamá está no meio do caminho entre a América do Sul e os Estados Unidos. Serve de escala para muitos voos: 2,8 milhões de passageiros fizeram conexão no Aeroporto Internacional de Tucumén em 2013 até setembro.

Pessoas que ficam poucas horas no país e podem aproveitar para fazer compras. E elas contam com uma facilidade. O Panamá é o país mais internacionalizado da América Central, segundo o Índice de Globalização das Nações Unidas. E a gente percebe isto no dia-a-dia, na hora de fazer uma compra, por exemplo. Você paga em dólar, porque o país tem duas moedas, o dólar e a balboa, mas todas as vendas são feitas em dólar. E se der sorte pode receber uma balboa de troco.
No caminho para as compras, os turistas encontram uma cidade que cresce para o alto. Da Cinta Costera, é possível ver os modernos arranha-céus. E os barcos de luxo. O espaço, de 26 hectares aterrado no mar, foi aberto há quatro anos e deu à capital novas áreas verdes e de lazer. Mirantes com uma vista de cartão-postal, ciclovia, fontes e espelhos d´água, árvores e plantas tropicais. Uma iniciativa inspirada na paisagem do Rio de Janeiro, segundo os urbanistas que a projetaram.
A primeira fase da construção da Cinta Costera custou US$ 189 milhões e foi executada pela companhia brasileira Odebrecht. A empresa está presente em várias obras pelo país. Só as outras duas fases da via têm investimentos de US$ 829 milhões.





Tanta beleza ao lado de uma via lotada de veículos. É a avenida Balboa, a mais importante do centro. Como nas grandes cidades brasileiras, na hora do "rush", o trânsito na capital panamenha para. E dá-lhe buzina! Aqui elas fazem parte do cotidiano.

Obras, compras, cassinos. O dinheiro circula pelo Panamá. As atividades financeiras e o turismo são o coração da economia do país, tido como um paraíso fiscal. São mais de 30 instituições bancárias. O canal e o registro de navios mercantes também atraem divisas. É a força do setor de serviços, que representa 78,7% da economia.

Em 2012, o Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país, atingiu US$ 52 bilhões. Nos últimos dois anos, a economia panamenha cresceu acima dos 10% - 10,6% em 2011 e 10,7% em 2012. O PIB por pessoa é de US$ 9,5 mil, cerca de R$ 22 mil, o mesmo do Brasil. As exportações do país somaram quase US$ 19 bilhões em 2012. A inflação naquele ano fechou em 5,7% e o desemprego em 4,4%.
Olhando para trás, os panamenhos dizem que a vida está melhor. “Boa. Muito boa, economia forte”, fala Lenin Santana, o vendedor de chapéu. Mas a riqueza nem sempre chega à população mais carente. Muitos se preocupam com a situação do emprego depois que o "boom" da construção passar. E criticam a concentração de investimentos na capital, onde vive metade da população do país.
A vendedora Michelle Salazar, da banca de gravatas do shopping, tem 27 anos e trabalha há sete no local. Ela conta que não é possível viver com o salário mínimo nacional, de US$ 432, quase mil reais. “Porque a comida está muito cara. O básico, na comida o arroz, o azeite, a carne... Está muito caro.”
As estradas principais têm pedágio. A tarifa mais baixa custa pouco menos de US$ 1,50, cerca de R$ 3,50. Não há imposto sobre a propriedade de veículos ou imóveis. Nada de IPVA ou IPTU. O cidadão paga um imposto sobre valor agregado, 7% sobre qualquer produto comprado. É como um imposto único. Só a zona de livre comércio de Colón, a 70 quilômetros da capital, e as lojas "free shop" estão isentas.



Mas não são só as compras e o famoso canal que sustentam o turismo no Panamá. Banhado por dois oceanos separados por menos de cem quilômetros de rodovia, o país também tem praias. A água é limpa, mas a infraestrutura em muitas delas deixa a desejar. Em La Angosta e Isla Grande, no Mar do Caribe, no lado do Atlântico, grande parte dos banhistas era panamenha quando lá estivemos.


* Reportagem feita originalmente para o programa "Matéria de Capa", da TV Cultura (dom., 19h)

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